Revista VEJA - Edição 2108 - 15/04/09
Na novela das 8, os males dos jovens são desencadeados por seus pais monstruosos!
Os jovens Tarso (Bruno Gagliasso) e Zeca (Duda Nagle), da novela Caminho das Índias, têm distúrbios bem diferentes. O primeiro é inseguro e sofre de esquizofrenia, o outro é um pitboy que se acha acima de punições. Há, contudo, um traço em comum: o que desencadeia seus problemas é o fato de terem pais monstruosos. Os folhetins de Glória Perez são pródigos em mostrar as consequências da negligência familiar. América (2005) oferecia uma galeria de jovens desajustados em decorrência da má-educação. Mas a noveleira se supera na atual trama das 8 da Globo. Zeca destrata sua professora, espancou um garoto na escola e, mais tarde, outro colega que o denunciou na internet. Em vez de o censurarem, seus pais, César (Antonio Calloni) e Ilana (Ana Beatriz Nogueira), alardeiam que o filho é perseguido. César estimula o pitboy a fazer "coisas de macho". "Já vi pais até piores do que ele", diz Calloni. O lar de Tarso também causa arrepios. O pai, Ramiro (Humberto Martins), é um castrador. A mãe, Melissa (Christiane Torloni), só pensa nela. Tarso tem surtos cada vez piores. Trancado no quarto, de olhos esbugalhados, já ouviu uma voz cavernosa que o chamava de homossexual e babaca. Na rua, deu um soco numa criança, por julgar que ela o xingava.
Por meio desses personagens, Glória Perez busca chamar atenção para dois problemas reais. A questão é que incorre em simplificações. Tome-se o exemplo do pitboy. É evidente que os pais têm responsabilidades incontornáveis quando um jovem descamba para a violência. Mas não só eles: a escola e o grupo a que o jovem pertence também são influências importantes. Demonizar os pais e mostrar a escola como vítima, como se dá na trama, é um passo em falso. "A novela fica só na caricatura", diz a psicóloga Lidia Aratangy. Por baixo de todo o didatismo com que colocou a esquizofrenia em pauta, o folhetim também faz lá seus reducionismos. As pressões familiares podem ser um estopim para o afloramento do transtorno mental. Mas não constituem sua causa, como o drama de Tarso pode levar a crer (ele mesmo reclama: "Me sinto oprimido, não consigo ser eu"). "A esquizofrenia tem múltiplos fatores. Não dá para pôr a culpa nos ombros dos pais", diz Mauro Aranha, da Associação Brasileira de Psiquiatria. Tudo bem, é uma novela – e o autor não é obrigado a falar de temas sérios. Só que, quando se propõe a isso, precisa ter compromisso com a exatidão.
Por meio desses personagens, Glória Perez busca chamar atenção para dois problemas reais. A questão é que incorre em simplificações. Tome-se o exemplo do pitboy. É evidente que os pais têm responsabilidades incontornáveis quando um jovem descamba para a violência. Mas não só eles: a escola e o grupo a que o jovem pertence também são influências importantes. Demonizar os pais e mostrar a escola como vítima, como se dá na trama, é um passo em falso. "A novela fica só na caricatura", diz a psicóloga Lidia Aratangy. Por baixo de todo o didatismo com que colocou a esquizofrenia em pauta, o folhetim também faz lá seus reducionismos. As pressões familiares podem ser um estopim para o afloramento do transtorno mental. Mas não constituem sua causa, como o drama de Tarso pode levar a crer (ele mesmo reclama: "Me sinto oprimido, não consigo ser eu"). "A esquizofrenia tem múltiplos fatores. Não dá para pôr a culpa nos ombros dos pais", diz Mauro Aranha, da Associação Brasileira de Psiquiatria. Tudo bem, é uma novela – e o autor não é obrigado a falar de temas sérios. Só que, quando se propõe a isso, precisa ter compromisso com a exatidão.
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