segunda-feira, 27 de julho de 2009

‘Fechamos os manicômios para ampliar a qualidade do atendimento'


Em entrevista publicada dia 20 de julho de 2009, segunda-feira, no jornal A Tribuna, Pedro Gabriel Godinho Delgado (foto), Coordenador Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde é por demais esclarecedora sobre a conduta que o Governo Federal adota em relação ao tratamento de pessoas que sofrem de transtornos mentais.


Delgado, que esteve em São Vicente participando de um seminário sobre saúde mental, rebate uma série de críticas que são feitas sem fundamento às diretrizes que desestimulam a internação e o isolamento em manicômios e desfaz diversos equívocos cuja disseiminação é estimulada pela má-fé daqueles que, por interesses próprios, se opõe à humanização da assistência às pessoas com distúrbios psíquicos e à preservação de seus direitos fundamentais como cidadãos. (Segunda-Feira, 20 de Julho de 2009, 06:33 -Jornal A Tribuna de Santos -Da Redação por Valéria Malzone)


Entrevista: Pedro Gabriel Godinho Delgado - Coordenador Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde


Médico psiquiatra e coordenador do programa de Saúde Mental do Ministério da Saúde (MS), Pedro Gabriel Godinho Delgado, afirmou que a discussão existente hoje no Brasil entre grupos que defendem a internação em manicômios e os que não aceitam mais nenhum tipo de internação, para pacientes com problemas mentais (desde os casos mais clássicos até depressão profunda grave), é democrática, porém "é errada". Segundo o especialista, que esteve em São Vicente, durante um seminário de Saúde Mental, o Ministério da Saúde defende o fechamento dos manicômios, o fechamento também dos grandes hospitais psiquiátricos, porém, ampliando a qualidade do atendimento e internando os pacientes somente quando for realmente necessário e "em condições melhores".


Existem ainda manicômios no Brasil?

Sim. Ainda existem no País manicômios judiciários do sistema penal, com quatro mil leitos, em 22 estados do Brasil. Além disso, há 208 hospitais psiquiátricos clássicos, sendo 20% públicos e 80% privados, que são conveniados com o Poder Público. Nestes, há 35 mil leitos.


Mas está em redução este número de manicômios e hospitais psiquiátricos?

Sim. De 2001 até 2008, descemos de 60 mil leitos em hospitais psiquiátricos para 35 mil. Estamos reduzindo entre 2.500 e 3 mil leitos ao ano.


E como é a política de tratamento, tanto nos manicômios como nos hospitais psiquiátricos?

Os manicômios judiciários ou hospitais de custódia são ainda um problema grave. Estamos até discutindo com o Ministério da Justiça e com a Secretaria Especial de Direitos Humanos maneiras de mudar e atualizar o tratamento aplicado aos pacientes que estão em medida de segurança, ou seja, aqueles doentes mentais que cometeram delitos. Já o tratamento nas clínicas e hospitais psiquiátricos está em transformação e atualização, além da própria redução de leitos.


E como é esta atualização do perfil dos hospitais psiquiátricos?

Esta mudança de tratamento está em franca expansão nos hospitais de pequeno porte, de até 160 leitos, o que é muito comum nas cidades interioranas, e é o que consideramos ideal. Queremos modificar os hospitais enormes, como um existente em São Paulo, na região de Itapira, com cerca de 800 leitos.


Hoje, o que mudou no tratamento para estes pacientes?

Estes hospitais enormes, que queremos fechar, têm ­ até por razões estruturais ­ um tratamento de menor qualidade. Isto significa uso inadequado de medicamentos, por tempo muito prolongado, que muitas vezes o paciente não precisa mais.


Além dos medicamentos, ainda se usa a chamada eletroconvulsoterapia (ECT) ou eletrochoque? Sim. A ECT é utilizada no Brasil para tratamentos específicos, principalmente para pacientes com depressão profunda grave, com risco de suicídio, e nos casos de esquizofrenia catatônica, sem resposta aos medicamentos. Porém, ao contrário do passado, hoje há um controle na sua aplicação. É preciso inclusive autorização por escrito do paciente ou da família. O paciente também recebe todo um preparativo, incluindo anestesia geral de curta duração. As instituições que aplicam a ECT, cuja maioria é do setor privado conveniado, precisam de autorização da Vigilância Sanitária, inclusive.


Qual é hoje a demanda no Brasil de doentes mentais?

Hoje, sofrem de transtornos mentais severos (esquizofrenia, autismo, psicose infantil, neuroses graves, depressão profunda e deficiência mental severa com sintomas psicóticos) 3% da população do País, ou seja, entre 5 e 6 milhões de pessoas. É muita gente. Se além destes pacientes graves, considerarmos aqueles que possuem os chamados transtornos mentais leves (depressão não tão profunda, fobias, demências moderadas e fobias), chegamos a 12% da população (cerca de 20 milhões de pessoas).


E qual a metodologia ideal de tratamento hoje?

Atualmente há muito sucesso nos tratamentos que começam na própria comunidade, aliados ao serviço público. Além disso, o gestor público deve se preocupar commecanismos de promoção de saúde, de controle da ansiedade, de promoção de lazer, de promoção de cultura e de esporte. Tudo isso ajuda, e muito, a evitar os transtornos mentais.


No passado, os alcoólatras eram tratados como loucos e enviados para manicômios. Como está isso hoje?

O alcoolismo é hoje o principal problema a ser tratado pela saúde pública. E isso em todo o mundo, não só no Brasil. Há muitos usuários, que são dependentes, e não sabem. Há também os casos graves, que precisam de atendimento clínico. O melhor lugar para atender a pacientes com este perfil é o hospital geral (normal). A internação de pacientes alcoolistas em hospitais psiquiátricos é um erro e que ainda acontece no Brasil, mascada vez menos.Os centros de atenção psicossociais (Caps) específicos para alcoólatras e drogados (AD) são bem mais adequados para este atendimento.

terça-feira, 21 de julho de 2009

A FAMÍLIA É A VILÃ


Revista VEJA - Edição 2108 - 15/04/09

Na novela das 8, os males dos jovens são desencadeados por seus pais monstruosos!


Os jovens Tarso (Bruno Gagliasso) e Zeca (Duda Nagle), da novela Caminho das Índias, têm distúrbios bem diferentes. O primeiro é inseguro e sofre de esquizofrenia, o outro é um pitboy que se acha acima de punições. Há, contudo, um traço em comum: o que desencadeia seus problemas é o fato de terem pais monstruosos. Os folhetins de Glória Perez são pródigos em mostrar as consequências da negligência familiar. América (2005) oferecia uma galeria de jovens desajustados em decorrência da má-educação. Mas a noveleira se supera na atual trama das 8 da Globo. Zeca destrata sua professora, espancou um garoto na escola e, mais tarde, outro colega que o denunciou na internet. Em vez de o censurarem, seus pais, César (Antonio Calloni) e Ilana (Ana Beatriz Nogueira), alardeiam que o filho é perseguido. César estimula o pitboy a fazer "coisas de macho". "Já vi pais até piores do que ele", diz Calloni. O lar de Tarso também causa arrepios. O pai, Ramiro (Humberto Martins), é um castrador. A mãe, Melissa (Christiane Torloni), só pensa nela. Tarso tem surtos cada vez piores. Trancado no quarto, de olhos esbugalhados, já ouviu uma voz cavernosa que o chamava de homossexual e babaca. Na rua, deu um soco numa criança, por julgar que ela o xingava.
Por meio desses personagens, Glória Perez busca chamar atenção para dois problemas reais. A questão é que incorre em simplificações. Tome-se o exemplo do pitboy. É evidente que os pais têm responsabilidades incontornáveis quando um jovem descamba para a violência. Mas não só eles: a escola e o grupo a que o jovem pertence também são influências importantes. Demonizar os pais e mostrar a escola como vítima, como se dá na trama, é um passo em falso. "A novela fica só na caricatura", diz a psicóloga Lidia Aratangy. Por baixo de todo o didatismo com que colocou a esquizofrenia em pauta, o folhetim também faz lá seus reducionismos. As pressões familiares podem ser um estopim para o afloramento do transtorno mental. Mas não constituem sua causa, como o drama de Tarso pode levar a crer (ele mesmo reclama: "Me sinto oprimido, não consigo ser eu"). "A esquizofrenia tem múltiplos fatores. Não dá para pôr a culpa nos ombros dos pais", diz Mauro Aranha, da Associação Brasileira de Psiquiatria. Tudo bem, é uma novela – e o autor não é obrigado a falar de temas sérios. Só que, quando se propõe a isso, precisa ter compromisso com a exatidão.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

O Maior estudo sobre Esquizofrenia no mundo, deu no O GLOBO

MAIS DE TRINTA MIL MUTAÇÕES CONTRIBUEM PARA A DOENÇA, REVELA MAIOR ESTUDO JÁ FEITO

O maior estudo já feito sobre a Esquizofrenia comprova o forte componente
genético da doença: um terço de suas causas seriam resultado do efeito
acumulativo de 30 mil mutações. O trabalho revelou também que erros numa
misteriosa região do DNA humano aumentam de 15% a 25% os riscos de uma
pessoa ter esquizofrenia. Tais revelações fazem parte da pesquisa feita por
um grupo internacional, que gerou três estudos independentes, publicados na
revista “Nature”. A complexidade do problema, dizem os cientistas, torna
muito difícil o desenvolvimento de testes de diagnóstico, mas as descobertas
abrem caminho para novos tratamentos.

MAL É MAIS COMPLEXO DO QUE SE IMAGINAVA

O trabalho mostra que a esquizofrenia não tem uma única causa genética.
Segundo os pesquisadores, a doença – que se caracteriza por distúrbios do
pensamento, incluindo alucinações e alterações de comportamento – pode
ocorrer não apenas por causa de raras variações genéticas, mas também pelo
acúmulo de milhares de alterações comuns.
“-A esquizofrenia parece um gigantesco e desconcertante quebra-cabeças, do
qual encontramos apenas algumas peças “ diz Thomas Insel, diretor do
National Institute of Mental Health, a maior organização de pesquisa do
mundo, especializada em saúde mental, que financiou os estudos.
Mesmo assim, os pesquisadores conseguiram identificar alguns genes ligados
à essa doença crônica. OS ESTUDOS MOSTRARAM AINDA QUE O TRANSTORNO BIPOLAR
TEM BASES GENÉTICAS SIMILARES ÀS DA ESQUIZOFRENIA.
Os cientistas analisaram sete regiões de variação genética em 50 mil
pessoas, algumas com a doença e outras saudáveis. Eles descobriram que os
portadores apresentavam 15% mais variações em três áreas localizadas nos
cromossomos 15 e 1.
Cinco dessas variações estão presentes num cromossomo que está ligado ao
surgimento de doenças como o diabetes do tipo 1 e problemas imunológicos.
Alguns cientistas chamam essa região de “TRIÂNGULO DAS BERMUDAS” do genoma
humano.
“-Sem dúvida, a localização dessas cinco variações nessa região, também
ligada a doenças imunológicas, é intrigante” diz Pablo Gejman, diretor da
NorthShore University, em Illinois, nos Estados Unidos, que participou dos
estudos.
Além disso, os especialistas confirmaram que uma supressão já conhecida no
cromossomo 22 está envolvida na doença. O desafio agora, dizem, é descobrir
a influência exata que essas mudanças nos genes têm na esquizofrenia e como
atuam para que a doença se manifeste.
“-Há tantos genes envolvidos na doença que a idéia de predizer se alguém
vai desenvolver a esquizofrenia não parece muito provável” afirmou Michael O
’Donovan, da University Of Cardiff, que participou de um dos estudos. “-Mas
acredito que novas análises revelem muitas rotas genéticas para os sintomas
da esquizofrenia.”

METADE DAS OCORRÊNCIAS SERIA HEREDITÁRIA

Apesar dessa previsão, segundo os pesquisadores, ainda falta muito para
que se obtenha um quadro completo de como essas falhas genéticas poderiam
agir juntas ou separadamente para produzir os sintomas da esquizofrenia. Mas
eles calculam, baseados em estudos sobre gêmeos idênticos, que metade dos
casos de esquizofrenia é herdado, enquanto o resto tem outras causas.
Embora não tragam benefícios médicos imediatos, as descobertas revelam um
pouco mais da biologia dessa doença, que atinge cerca de 1% da população
mundial, principalmente entre 15 e 35 anos. Isso pode levar melhores
tratamentos para a esquizofrenia.

PRECONCEITOS RETARDA DIAGNÓSTICO

Tratamento é feito com antipsicóticos

No Brasil, estima-se que a esquizofrenia atinja cerca de 1,8 milhão de
pessoas. Como retrata o personagem Tarso, da novela “Caminho das Índias”, de
Glória Perez, o preconceito ainda é um dos principais motivos para o atraso
no diagnóstico da doença.
“-Existem muitos preconceitos em torno da doença” afirma Mário Louzã,
coordenador do Projeto Esquizofrenia, do Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas de São Paulo. “-Ainda é muito comum a esquizofrenia
ser confundida com depressão, crise de adolescente ou mesmo uma esquisitice
passageira. E quanto mais tardio o diagnóstico, mais difícil é o seu
controle.
Em geral, a esquizofrenia começa a se manifestar no fim da adolescência e
no início da vida adulta, com alterações nas atitudes dos portadores da
doença, que acabam por interferir no seu convívio social. O tratamento é
feito com antipsicóticos, que podem também ser associados com a
psicoterapia.

O GLOBO – QUINTA FEIRA - 02/07/2009
CADERNO DE CIÊNCIA