quarta-feira, 27 de março de 2013

Não a privatização da Saúde Mental e do SUS! Todo apoio ao primeiro CAPS do Brasil, o CAPS Professor Luis da Rocha Cerqueira, Itapeva-SP!


MANIFESTO EM DEFESA DO CAPS ITAPEVA
E DO SUS.

Queremos noticiar, por meio deste brevíssimo texto escrito às pressas, a difícil jornada que nós, profissionais da saúde mental, temos enfrentado; em especial nestes últimos dias. O intuito aqui é transmitir que, recentemente, e mesmo não estando na ditadura, sofremos um golpe. Gostaríamos de compartilhar com outros profissionais, serviços de saúde, aos que se interessam pela saúde mental e pela defesa do SUS e movimentos sociais em defesa da vida, aos que militam ainda por uma “sociedade sem manicômios” e pela manutenção dos ideários da Reforma Psiquiátrica. E, ainda, aos psicanalistas interessados pela clínica da psicose, pelas questões da saúde pública. O evento de “caça às bruxas” que, infelizmente, estamos enfrentando neste momento no CAPS e que todos estamos cientes que faz parte de um contexto muito maior e bastante atual. Esperamos, assim, disparar uma discussão mais ampla.
O CAPS Professor Luís da Rocha Cerqueira – bastante conhecido como CAPS Itapeva – teve nos seus últimos anos sob a gestão da Organização Social SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento para a Medicina). O nome desta organização, que também gerencia outros equipamentos de saúde espalhados pela cidade de São Paulo, já sugere que a sua preocupação é bem específica. A sua administração tem comprovado que o seu interesse é exclusivamente a medicina, interesse este que não se estende aos pacientes nem tampouco à saúde mental. Explicaremos…
No início desta semana, fomos surpreendidos com a notícia de que haveria uma demissão em massa – na qual cerca de 30 profissionais em regime de CLT foram desligados abruptamente do serviço. O motivo alegado pela direção era o corte de verba realizado pela Secretaria de Estado da Saúde. Anexado a este aviso, também nos foi informado que seríamos liberados do cumprimento do aviso prévio e, ainda, que seríamos indenizados de acordo com a lei e que não precisaríamos voltar ao CAPS, ficando à direção com a incumbência de comunicar o nosso desligamento aos usuários. Obviamente, ignoramos esta última sugestão, para não dizer solicitação, recusando a desaparecer do CAPS. Desse modo, temos – além de administrar o impacto desta notícia para cada um de nós e a forma violenta como tal manobra foi feita pela direção do serviço -, nos dedicado a realizar a despedida com os nossos usuários, tentando explicar para cada um a situação, fazer o desligamento e, em alguns casos, planejar e realizar os encaminhamentos possíveis. Apesar de estar sendo um momento de expressivo sofrimento para usuários e funcionários, impossível de disfarçar, temos tentado suavizar, na medida do possível, o impacto desta situação, acolhendo os usuários que, por sua vez, têm se mostrado muito lúcidos e também acolhedores para com a equipe nesta circunstancia tão devastadora.
Nesta reunião da direção com os funcionários que se deu em caráter de informe (não deixando nenhuma brecha para qualquer debate e esclarecimentos); aliás um, senão o único, esclarecimento que nos foi dado foi assim explicitado: uma equipe mínima se responsabilizaria pelo cuidado de mais de 500 pacientes – garantindo, então, que o CAPS não fechasse as suas portas -, e que não precisaríamos nos preocupar. Mas, isto é quase impossível para os que escolheram trabalhar em um equipamento como o CAPS, cuja missão é acompanhar intensivamente os pacientes com quadros mentais graves e seus familiares.
A nossa hipótese é que este corte de vários profissionais alocados neste CAPS foi um pretexto para fazer a “faxina”, ou seja, retirar aqueles que incomodam, que, no entender da direção, “atrapalham” porque relembram incessantemente os princípios reformistas, que entendem que o CAPS é um lugar de uma construção coletiva que leva em consideração seus usuários e profissionais para a efetuação de qualquer mudança, que enfrentam a loucura sem querer normatizá-la, que não evita os conflitos que existem em todo e qualquer ambiente institucional, que entende que os impasses na clínica podem ser promotores de avanços teóricos e, consequentemente, para a própria clínica.
Pela experiência que tivemos até então, a política da SPDM é manter a gestão separada da clinica. A sua perspectiva de trabalho é bastante médica, verificável nas mínimas condutas, Por exemplo, no início do convênio firmado com esta OSS, a direção insistia em que a triagem deveria ser uma atribuição dos médicos, desconsiderando que o acolhimento, em um modelo CAPS, é uma prática que todos os profissionais participam. Em outro momento, quiseram instituir um programa em parceria com a UNIFESP que, no CAPS, denominaram de “Programa de Esquizofrenia Refratária”, que caracterizaria por um grupo que atuaria junto aos pacientes com diagnóstico de esquizofrenia em uso de clozapina. Sempre aprovamos que o serviço pudesse usufruir do que há de melhor em termos de medicamentos, mas não apoiamos sobremaneira as ações e programas cujo recorte é a doença, pois estas propostas correm na contramão de um CAPS. Foram vários enfrentamentos da equipe com a direção que nos mostravam todos os dias um desconhecimento das balizas que norteiam o nosso trabalho. E mais grave: desconhecem a premissa fundamental do CAPS, a saber: a instituição é um recurso da clínica e não apenas um espaço físico para alojar loucos. Assim, a conseqüência é que temos vivido, sobretudo, com esta experiência, que a direção não faz questão de que a instituição seja hospitaleira, pois desconsidera os princípios mais básicos para uma relação de convivência com a diferença, que prima pelo respeito e pela reciprocidade.
A nossa hipótese é de que com essas mudanças todas, eles até poderão continuar a se nomear CAPS (e receberem muito por isso), mas será a realização de uma outra proposta: um ambulatório, um centro de referência, um centro de especialidades, um setor de hospital, um estacionamento (como ironizou uma ex-servidora) ou qualquer outra coisa, menos um CAPS.
Infelizmente, o que temos assistido é que o CAPS Itapeva – que carrega uma história tão longa no campo da saúde mental e também na formação de profissionais -, tem sido desmontado por meio de muitas estratégias (que aqui não daria para esmiuçar), sendo a demissão em massa apenas uma delas. Ambicionando um ambiente asséptico em que não cabe nenhuma espécie de discordância e conflito, esta administração não coloca a clínica em primeiro lugar. Ademais, despreza as diretrizes e princípios estipulados pelas portarias ministeriais, o que enfraquece o SUS. Com a saída maciça de profissionais, muitos projetos, oficinas, grupos, atendimentos, equipes, parcerias institucionais e intervenções no território foram encerrados; destruindo, em nossa opinião, em um tempo tão curto, investimentos de tantos anos. A execução das demissões tem redundando numa série de desdobramentos e o que constatamos é que o maior ataque é dirigido ao próprio CAPS, já que a instituição não é o espaço físico somente, mas são as pessoas, os profissionais e os pacientes que animam esta clínica, bem como as práticas e os acontecimentos construídos cotidianamente e compartilhados coletivamente…
Cabe ainda dizer que, mais do que garantir os nossos empregos ou lutar por condições mais dignas e favoráveis de trabalho no campo da saúde, a nossa intenção com este texto é manifestar publicamente a nossa insatisfação com esta situação e, sobretudo, defender o CAPS. Em se tratando do Itapeva, o CAPS mais antigo do Brasil, o primeiro a experimentar a clínica ampliada, que alojou àqueles que participaram da sua invenção (antes mesmo deste projeto se constituir como lei) e que estavam atravessados pelas experiências de Reforma no mundo, a saber: a psicoterapia institucional francesa, a desistitucionalização italiana, dentre outras; e que fizeram valer, desde 1987, a proposição de Basaglia de que é possível e desejável uma clínica que coloque a doença entre parênteses e cujo foco seja a existência/sofrimento, e que, no dizer dos simpatizantes da psicanálise, uma clínica cujo foco é o sujeito.
Enfim, a nossa indignação pode ser ainda explicitada com estas perguntas: Como essas pessoas – impregnadas por um discurso médico e psiquiatrizante, que estiveram ao longo de seus itinerários formativos e de trabalho, tão alienadas destes movimentos históricos e sociais, especialmente, da reforma psiquiátrica, movimento este que dá norte a todos os CAPS -, podem gerenciar este projeto? Como entregar nas mãos desses que se dizem especialistas em cuidar de pacientes com “transtornos mentais graves” (como eles gostam de dizer) e, que ao fazer o gerenciamento do serviço a seu bel prazer, desconsideram o vínculo? Como deixar que estes gestores administrem um equipamento deste porte como uma empresa e não como um serviço de saúde, viabilizando ações que banalizam os efeitos da ruptura para os pacientes psicóticos? Que tipo de lugar tem a clínica para eles? Qual o compromisso com os usuários? O que fazer para impedir esse desmantelamento de um trabalho coletivo construído há anos cuja aposta é fortalecer uma clínica artesanal, inevitavelmente implicada com as ações e com o desejo de cada um? Em suma, como aceitar tamanha contradição?

Este manifesto foi enviado por e-mail e, infelizmente está apócrifo, mas a luta e solidariedade em rede é sempre coletiva e impessoal. Tem a força das multidões!

TODO APOIO
EQUIPE NEPS-UERJ
CAPS-UERJ

sábado, 9 de março de 2013

APOIO A CPI da INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA no Rio de Janeiro



Manifesto em apoio a Comissão Parlamentar de Inquérito da Internação Compulsória proposta pelo vereador Renato Cinco


As entidades, movimentos, organizações da sociedade civil abaixo-assinados vem, por meio deste, manifestar apoio à proposta de aprovação da CPI da Internação Compulsória pela Câmara dos Vereadores da cidade do Rio de Janeiro. Solicitamos aos vereadores desta casa que se atentem para a gravidade e os efeitos nocivos da atual política de “combate ao crack” da prefeitura do Rio de Janeiro – centrada nas ações de recolhimento e internação forçada e massificada da população em situação de rua – e assinem o pedido da CPI da Internação Compulsória.

Em maio de 2011 a prefeitura do Rio de Janeiro anunciou as ações de recolhimento e internação forçada de crianças e adolescentes, instituídas pela resolução nº 20 da Secretaria Municipal de Assistência Social. Desde então diversas organizações, movimentos sociais, trabalhadores e usuários da rede pública de saúde, saúde mental e assistência social, órgãos de classe, órgãos do controle social, gestores públicos, membros do poder judiciário e da defensoria pública, pesquisadores, entre outros atores sociais, realizaram diversas ações manifestando o repúdio à política da prefeitura do Rio de Janeiro e a defesa das políticas públicas com base nas diretrizes do Ministério da Saúde. Em que pesem as denúncias acerca da ilegalidade e das irregularidades da política de internação compulsória e dos contratos e serviços prestados pelas instituições que atendem ao público alvo das operações, no dia 19 de fevereiro assistimos à primeira ação de recolhimento e internação forçada de adultos.

Como entidades e movimentos sociais com atuação nos campos da saúde, da luta antimanicomial, assistência social, infância e adolescência, cultura, educação, movimento negro, população em situação de rua, conselhos profissionais e universidades, defendemos a necessária ampliação e fortalecimento da rede pública de políticas sociais, em conformidade com o aparato legal e institucional regulamentados pelos Conselhos Nacionais e Ministérios da Saúde, Desenvolvimento Social e Combate a Fome e demais instâncias existentes. Defendemos a implementação das políticas públicas de saúde, saúde mental e assistência social já formuladas pelos conselhos nacionais, com base nas diretrizes do SUS e do SUAS, com a ampliação da rede de atenção psicossocial e a efetiva implementação de ações articuladas e intersetoriais que  garantam a assistência e o cuidado em liberdade e com respeito à dignidade humana.
São inúmeras as experiências bem sucedidas e efetivas de cuidado em saúde mental da população que faz uso de drogas, em serviços abertos, de base comunitária, articulados a outras políticas sociais, que promovem a autonomia e a cidadania, tal como previsto na Política Nacional de Saúde Mental. Trata-se de redes públicas, compostas por trabalhadores concursados, o que garante qualidade e continuidade do trabalho e dos profissionais. A internação em hipótese alguma pode ser adotada como uma política massificada, abusiva e generalizada para toda a população. 

A política de internação compulsória representa um enorme retrocesso nas conquistas da luta antimanicomial com a reedição de históricas práticas de enclausuramento e segregação verificadas nos antigos manicômios – hoje abrigos e comunidades terapêuticas – e nos persistentes hospitais psiquiátricos públicos e conveniados. O que podemos diagnosticar atualmente com a política de recolhimento e internação forçada é que o crack parece estar sendo usado como justificativa para ações violentas de higienização e controle dos pobres.

Desse modo, faz-se urgente a aprovação do pedido da CPI da internação compulsória para que se dê transparência à destinação dos recursos públicos em saúde mental e se apure a efetividade terapêutica da política de internação compulsória.

Para assinar, enviar um email para: cpiinternacao@gmail.com

Assinam esse Manifesto:

- Frente Estadual de Drogas e Direitos Humanos – RJ
- O Núcleo Estadual do Movimento de Luta Antimanicomial
- Justiça Global
- Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Saúde Mental e Atenção Psicossocial – NEPS da Faculdade de Serviço Social da UERJ
- Centro de Atenção Psicossocial da UERJ
- CEDECA/RJ – Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Rio de Janeiro
- Cultura Verde
- Rede Rio Criança
- CRP/RJ – Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro
- CRESS/RJ – Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro
- Grupo Tortura Nunca Mais/RJ
- ISER – Instituto de Estudos da Religião
- Projeto Transversões - Projeto Integrado de Pesquisa Saúde Mental, Desinstitucionalização e Abordagens Psicossociais
- Forum da Saúde do Rio de Janeiro
- Forum Nacional contra a Privatização da Saúde
- Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da ABI:
Mário Augusto Jakobskind , Presidente
Arcírio Gouvêa Neto, Secretário
Daniel Mazola Fróes de Castro, 2º Secretário 
Alcyr Cavalcanti
Antônio Carlos Rumba Gabriel
Germando Oliveira Gonçalves
Geraldo Pereira dos Santos
Gilberto Magalhães
Lucy Mary Carneiro 
Martha Arruda de Paiva
Orpheu Santos Salles 
Yacy Nunes
Ernesto Vianna
Maria Cecília Ribas Carneiro
Sérgio Caldieri
Miro Lopes
Luiz Carlos Azedo
Lênin Novaes de Araújo
José Ângelo da Silva Fernandes